Que cada vez mais
somos (ou nos permitimos ser) literalmente engolidos pela correria do dia a dia
é notório para todos. Tentamos nos equilibrar na efemeridade dos nossos
compromissos e atribuições, e a consequência disso é que cada vez mais e mais
ficamos sem tempo. E sem tempo para tudo, do lazer ao prazer, da família aos
amigos, ou ainda, tão simplesmente para nós mesmos. Vivemos uma dinâmica onde
tudo acontece muito rápido, nossa cultura atual se fundamenta na informação e
no imediatismo, e, consequentemente, incorporamos tal funcionamento em nossas
vidas.
Eu mesma admito que
ultimamente tenho ficado cada vez mais indisponível. Mas "estar sem
tempo" parece falar de uma vivência produtiva, atarefados de
responsabilidades, compromissos e obrigações, tão valorizada em nossa cultura. Será que por
conta disso está na moda ficar sem tempo? Será ainda que, em nossa
falta de tempo, paramos para respirar e discernir o que vale a pena, o que realmente
é necessário e desnecessário? Percebo que na maioria das vezes tentamos abraçar
tudo de uma vez para poupar tal tempo do qual não dispomos como se fôssemos
seres absolutos e onipotentes. E não somos... E que bom que não somos, que temos o próprio limite, nossas próprias necessidades. Afinal, precisamos delas, até mesmo para perceber-se, para saber até onde podemos ir, saber qual é o próprio espaço e fronteira pessoal. A consciência de que tudo é transitório deve fazer parte do bem viver, pois, desta forma, procuramos viver da melhor forma possível. Entretanto, em nossa tentativa diária de dar conta de tudo e no limite do nosso tempo, acabamos por ganhar os louros do cansaço físico e mental, se é que temos tempo para isso.
Talvez nossa
consciência de temporalidade nos leve ainda mais à uma corrida maluca contra
ela, como se isso fosse possível. Observo ser uma demanda bem dicotômica, pois
quanto mais tentamos aproveitar todo o tempo disponível que temos, apressados,
correndo, menos nos damos conta dele e do que acontece de realmente relevante à
nossa volta. As pessoas simplesmente não olham seu entorno, e quando olham, não
enxergam. Afinal de contas, como perceberiam, se estão o tempo todo
(pre)ocupadas com todos os compromissos assumidos? E como nos é precioso tal
tempo, e a mínima possibilidade de perda acaba sendo aterradora. Procuramos o
tempo todo otimizar o tempo.
Mas qual a
implicação que temos nisso tudo? A correria diária me remete à uma certa fuga
da realidade, e quando realmente paramos para prestar atenção nela, parece que
desperdiçamos mais tempo do que gostaríamos, sem levar em consideração alguns
valores essenciais da vida, e, o mais importante, sem perceber que o tempo mais
precioso que possuímos é sempre no aqui e agora, o presente. Precisamos de um
movimento interno de parar, respirar e enxergar, de fato, à nossa volta e,
principalmente, a nós mesmos. É um paradoxo, não é? Quanto mais lutamos contra
a perda de tempo, menos o percebemos passar, o mesmo tempo o qual apreciamos e
valorizamos tanto. Necessitamos de mais tempo para fazer mais coisas, e
possivelmente, se assim fosse, ainda nos comprometeríamos com mais atribuições.
Creio que ter mais tempo não traria uma maior qualidade de vida, e, na verdade,
devemos fazer o melhor possível com o que temos. Se essa é a realidade, é com
ela que devemos lidar, sendo capaz de formular as reais prioridades. Como
questionaria Renato, o poeta, "será que foi tudo tempo perdido...?"